Arte por Whittney de Araújo (https://www.instagram.com/w.whittney_arts/)
Com todas as mudanças que vêm acontecendo no mundo, não podemos deixar de lado as transformações no papel e liberdade das minorias: estamos em constante aprendizado e lutamos diariamente para vivermos em uma sociedade cada vez mais justa e igualitária. Dentre estas batalhas, temos o empoderamento feminimo, que tem o feminismo na América Latina como um de seus principais pilares de resistência.
Com a cultura machista tão intrínseca, é comum termos dificuldades para lidar com certas mudanças ao longo do tempo. Mas será que não é melhor olharmos para o lado progressista ao invés do problemático?!
Pensando nisso, convidamos você a entender melhor sobre como os movimentos feministas de toda a América Latina estão fazendo a diferença para o planeta.
Três figuras simbólicas no movimento feminista latino-americano
De ascendência chinesa, Arlen nasceu na Nicarágua em 1955. Ainda jovem, tornou-se guerrilheira contra a ditadura de Somoza e encontrou refúgio nos poemas e músicas que ela mesmo escreveu. Ela foi assassinada em 1975 durante um combate, com apenas 20 anos de idade, transformando em um mártir.
Sua curta vida, no entanto, intensa e dedicada ao ativismo político, inspiram e incentivam mulheres a lutarem ativamente pelos seus direitos até os dias de hoje:
Arlen participou ativamente da Revolução Sandinista, movimento responsável por derrubar a ditadura de Anastasio Somoza Debayle, que aconteceu 4 anos após a morte da guerrilheira;
Sua mente criativa e sensibilidade social trouxeram seu ativismo para a arte. Seus poemas e músicas, tal como “María Rural”, que idealizavam um mundo justo;
Por ser de origem chinesa e ter nascido na América Latina, Alren Siu também trazia consigo as múltiplas faces do feminismo, que consideram não apenas o gênero, como a etnia e a cultura de cada pessoa.
Em sua carta de despedida a sua família, antes de se juntar à Frente Sandinista, Arlen Siu disse:
“A luta persistente do ser humano pela perfeição é o verdadeiro amor. Somos mais autênticos na medida em que rompemos barreiras e limitações, enfrentando com coragem e otimismo as adversidades que encontramos pelo caminho. E um dia, descobrimos que somos capazes de mais do que nos é exigido e que podemos alcançar o que para alguns é proibido ou impossível.”
Bertha Lutz
Carioca, bióloga, ativista e política, Bertha Lutz é considerada uma das pessoas mais importantes para o feminismo na América Latina. Ela foi uma das principais líderes do movimento sufragista no Brasil, que exigia não só o direito ao voto para as mulheres, como também a sua participação na educação e no trabalho.
Além disso, ela também fundou a Federação Brasileira do Progresso Feminino em 1922, que demandava a participação igualitária da mulher nos âmbitos econômico, político e social e que inspirou milhares delas a ampliar esta luta. Também houveram conferências internacionais, tanto com a FBPF, quanto pela ONU, onde os ideais superaram os limites territoriais brasileiros.
Em 1932, o direito ao voto foi conquistado, mas a dedicação de Bertha em pautas feministas não cessou. Esse era apenas o começo. Afinal, a bióloga também os estudos eram essenciais para o empoderamento intelectual e, consequentemente, financeiro das mulheres.
Como uma das primeiras servidoras públicas do país e também eleita deputada federal do Rio de Janeiro em 1936, a ativista abriu caminho para milhares de mulheres e deixou como legado o espírito insaciável da luta pela equidade de gênero.
Bartolina Sisa
Bartolina nasceu em 1750 na região de La Paz, na Bolívia. Em 1782, ela foi comandante militar na resistência contra o domínio espanhol dos povos indígenas. E mesmo que os bolivianos não tenham vencido a batalha, Bartolina mostrou com sua própria coragem, força e determinação que as mulheres são competentes para ocupar esses espaços.
Além de ser considerada uma força contra a opressão colonial, a militar também foi é considerada um símbolo contra a opressão patriarcal que limita a liberdade das mulheres em diversas esferas sociais e econômicas até os dias de hoje.
Bartolina é uma das representações do feminismo indígena, que resiste contra o colonialismo, racismo e patriarcado. Além de destacar a importância do papel feminio no cuidado com a terra e na organização de suas comunidades e tradições ancestrais.
Sua relevância é tanta que, no dia cinco de setembro, o qual foi executada, é celebrado o Dia Internacional da Mulher Indígena. Além disso, em 1980, foi fundada a “Las Bartolinas” Confederação Nacional de Mulheres Camponesas Indígenas Originárias da Bolívia, em homenagem à líder militar. Entre os principais desafios debatidos por essa Confederação estão a pobreza, a marginilização social e violência contra as mulheres indígenas.
Com esses três exemplos breves de feminismo na América Latina, podemos enxergar que o movimento tem uma história profunda e é desenvolvido há anos. A pauta também é discutida por meio de figuras mundiais e revolucionárias para a libertação feminina.
Sem o passado não há como ter um presente e, muito menos, um futuro. Foi e ainda é preciso muita luta, resistência e combate para o direito das mulheres ser pauta dentre tantas agendas.
E como podemos enxergar o feminismo na América Latina atualmente?
Encontros Feministas da América Latina e do Caribe (EFLAC)
Os Encontros Feministas da América Latina e do Caribe (EFLAC) reúnem diversos movimentos feministas da região e ”contribuem com o fortalecimento da democracia na a partir da inclusão dos direitos humanos das mulheres desde uma perspectiva feminista na agenda dos Estados e sociedades” (informações colhidas e traduzidas do site).
Sua primeira edição aconteceu em 1981 e contou com mais de 250 participantes. Desde então, os encontros acontecem a cada dois ou três anos.
O EFLAC foi responsável por criar datas importantes para todo o continente, como, por exemplo, o Dia Internacional da Eliminação da Violência Contra a Mulher (25/11) e o Dia da Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe (28/09).
No ano passado, em 2023, aconteceu sua 15ª edição, sediada em El Salvador e frequentada por mais de 1500 pessoas. Durante o encontro, houveram discussões sobre o feminismo na região e também propostas que podem ser feitas para mudar o contexto atual, que ainda é permeado pelo patriarcado.
A última edição foi mais inclusiva que as anteriores, abrindo espaço para pessoas trans, não-binárias, e outras diversidades, sem deixar a acessibilidade de lado.
Ainda sem data definida, o próximo encontro será no Haiti.
Campanhas que empoderam mulheres
Sabemos que as mulheres são pioneiras em muitos movimentos, e não seria diferente na inclusão do protagonismo feminino na publicidade e nas empresas. Confira algumas destas campanhas:
Mujeres transformando: Iniciativa que promove treinamentos sobre liderança, economia e advocacia para incentivar a participação das mulheres nos âmbitos político e econômico de El Salvador.
SheWorks!: Criado na Argentina, o projeto faz a ponte entre mulheres e o mercado de trabalho, oferecendo oportunidades flexíveis e remotas, além de cursos e uma rede feminina de networking.
Mujeres construtoras da paz: O foco é preparar mulheres na Colômbia a manejar e liderar com conflitos armados em suas comunidades.
Elas na direção: Em 2023, a Chevrolet se uniu ao Instituto Plano de Menina para lançar a campanha ‘Mulheres ao Volante’, com o objetivo de incentivar mais mulheres a obterem suas carteiras de motorista. Com um investimento de mais de 1 milhão de reais, o programa ofereceu 220 vagas para mulheres em situações vulneráveis em todo o Brasil.
Future Females: Movimento global criado para incentivar o aumento do número de empresárias, oferecendo acesso digital e físico, além de suporte emocional para inspiração e colaboração. A plataforma é uma comunidade de empreendedorismo feminino, que estimula mulheres a investir em seu potencial.
Sebrae Delas: É um programa que impulsiona o empreendedorismo feminino por meio da orientação e inspiração de parcerias. Com o foco em aceleração, o objetivo é deixar o mercado cada vez mais profissionalizado para gerar empregos, identificação e economia mais potentes.
Mulher feminista brasileira e artista visual: Conheça Whytney Arts
Whittney de Araújo, moradora da região metropolitana de Recife (PE), é uma artista independente brasileira e feminista que atua com o ativismo em suas produções artísticas. Entrevistada acerca do tema pelo projeto Lupa do Bem – o qual, já faz parte da rede desde 2023, o ativismo e feminismo para ela, pode ser definido como:
“Um ato de coragem e uma forma de mostrar que as mulheres são capazes de conseguir o que querem ajudando umas às outras. Com o tempo, o termo “feminismo” foi um pouco corrompido e distorcido por algumas pessoas, mas eu vejo como um ato de coragem, temos que começar a mudança por algum lugar, e nada melhor do que começar por nós mesmas. É uma forma de pegarmos nossas dores e dificuldades diárias e nos transformarmos em algo maior.”
O que esperar do futuro?
Mesmo com muitos avanços, não podemos esquecer que ainda há um longo caminho pela frente.
Em 2015, a lei do feminicídio foi criada no Brasil para proteção de todas as mulheres. Desde então, pelo menos 10.655 mulheres foram vítimas de feminicídio, segundo os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Em 2023 tivemos o pior ano, com 1.463 vítimas de feminicídio, 1,6% a mais que o ano anterior.
Em El Salvador vem ocorrendo uma discrepância entre o entendimento de “ideologia de gênero” na educação. Bem como na Argentina, com o veto da “linguagem inclusiva”, a negação da violência de gênero e a diferença salarial entre homens e mulheres.
Mulheres progressistas, homens conservadores?
O jornal britânico Financial Times publicou no início deste ano um artigo sobre as perceptivas de homens e mulheres ao redor do mundo.
A partir dos resultados, podemos enxergar uma grande disparidade. Enquanto as mulheres se tornam cada vez mais progressistas, os homens se tornam mais conservadores. A pesquisa estadunidense Gallup, por exemplo, mostra que atualmente mulheres entre 18-30 anos são 30% mais liberais do que os homens.
Esse dado é apenas um dos reflexos das circunstâncias atuais e levanta um questionamento essencial para o futuro. O feminismo ainda é visto como um movimento muito distante para os homens, o que impede que muitos deles se juntem à luta das mulheres.
Por isso, é importante entender que o feminismo na América Latina – e no mundo todo – é o único caminho possível para permitir que mulheres tenham liberdade para fazerem o que desejarem. Seja sendo dona de casa, seja sendo a próxima CEO de uma empresa. Desde que sejam suas escolhas.
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